terça-feira, 13 de novembro de 2007

QUEM TUDO SABE, NADA APRENDE!

Podia muito bem ser de La Palisse, mas não é. Esta expressão lapidar era proferida pelo meu avô António. António ‘Gago’, como era conhecido lá na terra, embora de gago não tivesse nada. Falava como um rouxinol. E com muita sabedoria, também, apesar da sua pouca instrução académica, já que foi obrigado a abandonar o curso de medicina que tanto ambicionava quando se encontrava no segundo ano (naquela altura chamava-se 2ª Classe). Herdara o título do seu avô que era gago, e gostava dele – falo do título, já que do avô nunca lhe perguntei se gostava ou não.

Um belo dia o meu avô saiu-se com esta Lapalissada para um grupo de jovens, que o molestava com abundante verborreia acerca do míldio das videiras, a filoxera, e outras moléstias que atacam as videiras, que atingiu o principal interlocutor como um estalo sem mão. Estariam os “Engenheiros” certamente preocupados com a qualidade futura do precioso néctar que tão boa disposição lhes acabara de proporcionar – o vinho.

Paciente, brincalhão, matreiro, o meu avô foi dando corda à turba de jovens fanfarrões até que, quando viu chegado o momento exacto, como o pescador experiente que dá linha ao peixe até o cansar e subitamente dá o puxão misericordioso, atira à La Palisse cortando cerce a basófia dos melrinhos. (não pude impedir-me agora de pensar no Velho Santiago, de Hemingway, e no quanto pensei no meu avô enquanto lia O Velho e o Mar).

Diz o meu avô:

― Olhai, meus meninos, QUEM TUDO SABE, NADA APRENDE! – e voltou ao trabalho, com o sachito de pena a esfarelar os torrões de terra seca em volta da cepa das videiras.

Ora toma e embrulha! Vai buscar! Sim, senhor! Simplesmente esta singela e espinhosa premissa. Como uma rosa. Os espinhos foram com eles, cravados na alma. A rosa ficou comigo, plantada no meu coração (e deixem-me que lhes confesse, colocando de lado a modéstia a qual, sendo falsa, é pecado, que nos trinta anos que se seguiram, essa rosa já se reproduziu formando um jardim agradavelmente belo).

A expressão saiu seca, como um míssil atingiu sem desvios o alvo certo e produziu de imediato os estragos necessários. A turba dispersou, cabisbaixos. (à noite vi-os a jogar matraquilhos, divertidos. Já se haviam esquecido do sucedido, provavelmente – mas eu não).

Agora vejam só. Se alguma vez eu imaginava, naquele tempo, que iria necessitar tanto daquelas sábias palavras do meu avô no futuro. Não podia imaginar. Mas sim! Tenho essa necessidade, sim.

Não raro tenho que aturar pacientemente a presunção de gente que julga tudo saber. Hoje foi um desses dias. Daí a necessidade deste desabafo.

Cada vez mais me congratulo de ser ignorante. Ah! o prazer que me dá aprender!...

Obrigado Avô!...
L.P.

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