quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Declaração Europeia do Direito à Cidade

Se se tratasse de uma “Declaração Europeia dos Deveres do Cidadão” de certeza absoluta que me chapavam com ela em todos os locais visíveis dos meus domínios privados e não privados: ela era presa no limpa pára-brisas do carro, ela era na minha caixa do correio – apesar de ter lá estampado o selo amarelo dos correios, advertindo de que não deve ser lá colocada publicidade não endereçada – ela era pregada no placar do Condomínio, no espelho do elevador do meu prédio, enfim, possivelmente até helicópteros ou aviões ligeiros andariam a distribuir panfletos pelas cidades e pelas praias para que nenhum cidadão ficasse por conhecer os “seus deveres”.
Mas não, do que se trata é da Declaração Europeia do Direito à Cidade e que, volvidos quinze anos e alguns meses após a sua aprovação (Março de 1992) pela Conferência Permanente dos Poderes Locais do Conselho da Europa, quase que aposto que permanece desconhecida de mais de 90% da população europeia (em Portugal até mais, cuido eu – não é que eu avalie a ignorância dos outros pela minha, mas palpita-me).

Com a discrição que caracteriza a aprovação de documentos que contemplem direitos para o cidadão e sem a divulgação que mereceria por parte dos órgãos competentes a Declaração Europeia do Direito à Cidade reveste-se de particular importância pois emparceira com outro documento que, na história da civilização ocidental, serviu, meio século antes (1933), de esteio ao pensamento urbanístico de várias gerações: A Carta de Atenas – documento de compromisso, datado de 1933, redigido e assinado por grandes arquitectos e urbanistas internacionais do início do século XX, entre os quais se destaca Le Corbusier.
Humanizada em relação a documentos antecessores a Declaração volve um olhar sobre a totalidade e cada um dos problemas que atingem a Cidade (Sociedade) actual:
Os habitantes das cidades europeias têm direito:
  1. À segurança – a uma cidade pacífica e sem perigos, protegida dentro dos limites que o contexto social admita, contra a criminalidade, a delinquência e as agressões;
  2. Ao trabalho – a perspectivas de emprego que permitam a cada um, de acordo com a sua qualificação profissional, participar na criação da riqueza e usufruir dos benefícios que daí advêm;
  3. Ao alojamento – ao poder escolher num parque habitacional salubre, com uma oferta suficientemente ampla e a um preço razoável, uma casa que assegure tranquilidade e respeito pela privacidade pessoal e familiar;
  4. À mobilidade – a ter liberdade de efectuar deslocações cómodas e sem entraves, consequência de um equilíbrio harmonioso entre os diferentes utilizadores do espaço público;
  5. À saúde – a um ambiente e a um conjunto de equipamentos que garantam o seu bem estar físico e psicológico, a uma envolvente sã e limpa, livre de poluição do ar, da água e do solo, sem agressões acústicas e visuais;
  6. Aos desportos de lazer – ao acesso, sem discriminação de idade, de capacidade ou de nível económico, a uma gama adequada de equipamentos lúdicos;
  7. À cultura – à possibilidade de seleccionar, ter acesso e participar em actividades criativas de âmbito cultural;
  8. À integração multicultural – ou à garantia da coexistência pacífica de comunidades com origens culturais, éticas ou religiosas diversas;
  9. À coexistência harmoniosa das funções urbanas – de forma que a habitação, o trabalho, as deslocações e o acesso a actividades sociais possam coexistir e desenvolver-se em estreitas inter-relações;
  10. À participação – a intervir através de estruturas democráticas numa gestão urbana que se caracteriza pela concertação entre todos os intervenientes, pelo princípio da subsidiariedade, pelo acesso à informação e pelo repúdio de todo o exagero de regulamentação;
  11. A um desenvolvimento económico equilibrado – onde o Poder local chame a si a tarefa de conciliar o incremento da produção com a protecção do ambiente;
  12. Ao acesso a bens e serviços – diversificados e de qualidade, postos à sua disposição pelos poderes públicos, pelo sector privado ou pelos dois conjuntamente;
  13. À fruição das riquezas naturais – geridas pelos poderes locais de maneira racional, eficaz e equilibrada, em benefício de todos os cidadãos;
  14. Ao bem-estar individual – consequente da criação de um ambiente urbano propício à realização pessoal e ao desenvolvimento social, cultural, moral e espiritual de cada um;
  15. À solidariedade – com a garantia, por parte dos poderes locais da extensão destes direitos a todos os cidadãos, sem discriminação de sexo, idade e origem, de crenças, de situação social, económica e política, de incapacidade física ou mental.
  16. A uma envolvente agradável e estimulante – consequência, quer de uma arquitectura contemporânea de qualidade, quer da conservação e reabilitação cuidadosa do património edificado.
Claro que os políticos pensam como o meu avô: «queres ver os teus direitos devidamente satisfeitos? Pois trata de cumprir da mesma forma os teus deveres».
É justo, não?! Então estamos à espera de quê?!
Cumpramos os nossos deveres! Reivindiquemos os nossos direitos! Já!...
Conto convosco!...
L.P.

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