sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Mãos que não dais, o que é que esperais?!...

Está a chegar ao fim o último mês do ano: Dezembro – o mês do Natal. É seguramente o mês mais desejado por todos nós. O ambiente nas ruas não deixa ninguém indiferente. É, por isso, normal que a nossa memória nos traga ao presente recordações do passado.

Há dias, enquanto conversava com os meus pais (que me visitaram para os baptizados da minha filhota Leonor e do meu filhote Leonardo) recordamos algumas peripécias da minha infância.
Uma das histórias mais engraçadas passou-se há muitos anos, embora o protagonista tenha sido o meu irmão. Foi há trinta e poucos anos, por alturas do Natal.

O meu irmão estava naquela idade de teimar que o Pai Natal não existe e eu, agora que penso nisso, sinceramente, nem me aquecia nem me arrefecia, ou seja, não estava nem aí. Vindo as prendas, ficava agradecido e tanto se me dava que as tivesse trazido o Pai Natal ou a Mãe Natal ou a minha mãe ou o meu pai. Tanto se me dava. E se não houvesse prendas também não me afectava. O Natal para mim, mais do que as prendas, era o cheiro do musgo que íamos apanhar ao mato para fazer o presépio; o pinheirinho que escolhíamos e que ao ser cortado largava aquele aroma agridoce da resina fresca e jovem; era o boneco de neve que fazíamos nos campos – por esta altura eu morava em Figueira de Castelo Rodrigo e garanto-lhes que nevava todos os anos pelo Natal – e as boladas de neve que atirávamos uns aos outros no meio de uma algazarra de gargalhadas infantis e inocentes – e algumas imprecações, também, quando alguma bola de neve nos atingia em sítios menos agradáveis –; era o cepo enorme que ardia durante mais de uma semana na eira e à volta do qual todos os vizinhos se juntavam para confraternizar, de noite ou de dia; numa palavra o Natal era, para mim, ALEGRIA E SOLIDARIEDADE.

Naquele ano o meu irmão (mais velho do que eu vinte e sete meses) cismava com a minha mãe que o Pai Natal não existia, que eram os nossos pais que punham as prendas, etc. Andava mal-humorado, desobediente, preguiçoso, refilão. Eram coisas que ele ouvira lá na escola. E não queria fazer figura de parvo ele ‘com aquela idade’ acreditar no Pai Natal quando ‘todos sabiam’ que isso era ‘balela de crianças’.

A minha mãe avisava-o: – Olha que Jesus castiga-te!
Mas ele não fazia caso. Sabia a verdade e pronto. A verdade é que, apesar de toda essa sua nova crença, o meu irmão fez a sua lista de pedidos ao Pai Natal, tal como eu e como nos anos anteriores. Mistérios!... Pois se não acreditava nele, porque lhe endereçou o pedido?! Coisas de crianças…

Na noite de consoada, como todos os anos, deitamo-nos cedo pois não tínhamos o hábito de ir à Missa do Galo. Queríamos era que ele (o galo) se deitasse cedo também, para que madrugasse a cantar a alvorada dando-nos o sinal de que podíamos ir ver as prendas que o Pai Natal nos trouxera. Coisitas sem grande valor, mas prendas de enorme importância. A importância que nós tínhamos para alguém que vinha de tão longe de propósito para nos dar algo, em nossa casa. Em nossa casa, reparem bem, em nossa casa. O Pai Natal não passava pela multidão e atirava as prendas à rebatinha! Não! Ele vinha à nossa casa de propósito para nos entregar as 'nossas' prendas. Essa era a importância, esse era o valor: o da nossa existência.

Não me lembro quais foram as minhas prendas nessa madrugada de Natal. Mas lembro-me da prenda do meu irmão. E ele lembra-se também. Pudera!... Uma cebola! Isso mesmo, uma cebola no sapato! E sem direito a embrulho. Pintou o diabo. Chorou, refilou, atirou com a cebola ao chão com violência, batia o pé, e chamava a minha mãe de 'Má!’ e esta, com a sua calma habitual, esperou que se ele acalmasse e disse-lhe assim:

– Olha, meu filho, eu avisei-te. Eu disse-te que Jesus te castigava por não acreditares no Pai Natal. Não me deste atenção e desrespeitaste O Senhor com a tua arrogância. Há um ditado que diz: “Mãos que não dais, o que é que esperais?”.

O meu irmão passou a dar mais ouvidos à minha mãe e a receber de novo prendas no Natal.

Desta lição eu concluo que devemos estar sempre dispostos a dar o melhor de nós sem olharmos a quem. A alegria do nosso semelhante, proporcionada pelas nossas acções, é a melhor dádiva de Deus para nos retribuir...
Desejo a todos um Santo e Feliz Natal
L.P.

3 comentários:

Thor disse...

Gostei do que escreveste. Percorri facilmente as paisagens da tua memória. Até deu para sentir o frio da neve.
Saudade é também uma árvore já plantada no teu caminho.
Dá para ver que o Natal tem agora outros motivos de interesse.

Também sinto que o Natal é um momento em que a poesia sai dos livros e brilha nos olhos e nas ruas.
É um vento que sussurra histórias e nos torna outra vez sonhadores.

Envio-te estas palavras no trenó da Internet para que o Natal seja todos os dias.
Feliz Natal para ti e para toda a família.

Luís Paulo disse...

És um poeta, amigo Paiva (Thor).

Aproveitei o trenó que me trouxe as tuas palavras e fui dar mais umas voltinhas pelas paisagens da minha memória (aproveitando as tuas palavras).

Fiz uns esboços de algumas delas e, quem sabe, um dia destes não me decidirei a pintá-las para mostrar aos amigos. Quiçá?!...

Como tu és o Mestre dos lápis e dos pincéis possivelmente terei que pedir a tua colaboração para a mistura das cores.

Obrigado por tudo.

BOM ANO MÁGICO – 2008

L.P.

Martinha in da house disse...

boas recordações...recordar é viver.. também eu, no meu saber de gente pequena e nas minhas duvidas de gente grande, acreditei no pai natal ate bem tarde... porque acreditei sempre nas paravras da avó, porque também ela me disse a mesma coisa, e porque me fez acreditar que o pai natal existia mesmo... e eu acreditava... porque queria(?). porque é esse o espirito do natal... os entimentos... as tradições.. e porque acredito que os sentimentos também tem cheiro e tocam as coisas...queria voltar a ter aquela idade.
Saudades !!